Ei Pessoal!
Bom Dia!
Essa semana um amigo me indicou esse filme,
no entanto, não consegui ir ao cinema. Como a curiosidade ficou bem aguçada,
resolvi recorrer ao Google para obter maiores informações. Depois de ler
algumas críticas referentes ao longa (principalmente a que postei aqui) estou
ainda mais ansiosa para assisti-lo. Alguém já viu?
“Nossas vidas não são nossas. Estamos
vinculados a outras, passadas e presentes. E de cada crime, e cada ato generoso
nosso, nasce nosso futuro.
Na mitologia grega, Atlas foi o titã condenado
por Zeus a sustentar os céus sobre os ombros por toda a eternidade. Para mim,
não há dúvidas de que um feito semelhante foi concretizado pelo diretor alemão
Tom Tkywer e pelos irmãos Wachowski na adaptação aos cinemas da obra homônima
de David Mitchell, A Viagem. Ambicioso, ou mesmo para muitos, a obra expande-se
ao longo de meio milênio em seis histórias interconectadas por desígnios
íntimos, detalhes, uns óbvios, outros pequeninos quase insignificantes, ou
somente por rostos perpetuados no decorrer dos séculos, no aspecto mais banal
da narrativa, e curiosamente, aquele que mais chama a atenção do espectador.
Impressionando pela coesão e uniformidade da
narrativa, sobretudo por tratar-se de um esforço colaborativo com equipes
criativas distintas, uma dirigida pelos Wachowski, e a outra por Tykwer, A
Viagem marca os pontos de partida de sua jornada cedo no prólogo, situando o
espectador em diferentes épocas e gêneros narrativos. Há o cinema de época
abolicionista em 1849, semelhante a Amistad, e o retrato de um genial mas
problemático músico em 1936; um thriller jornalístico investigando uma
corporação em meados dos anos 70 e uma comédia geriátrica ambientada em um lar
para idosos nos tempos atuais; e também, uma ficção-científica passada no
século XXII e um drama pós-apocalíptico com toques religiosos mais de 100
invernos após o evento chamado A Queda. Cada história tem o seu protagonista –
respectivamente Sturgess, Wishaw, Berry, Broadbent, Bae e Hanks -,
revolucionários que modificaram a ordem mundial e estão conectados por um sinal
de nascença na forma de cometa. Há também a invariável figura do antagonista
vivido na maioria das vezes por Hugo Weaving em alguma de suas manifestações,
mas calma, chego lá em instantes.
Satisfatório ainda que visto só como uma
antologia de histórias e cujos muitos pontos de interseção pouco ou mesmo nada
interferem nas decisões feitas pelos personagens, a narrativa introduz objetos
que superam a barreira do tempo (o livro escrito por Luisa Rey ou um botão cujo
brilho lembra o de uma constelação), cenários são revisitadas (o asilo onde
Timothy Cavendish é internado pelo irmão é a mesma mansão do músico Vyvyan
Ayrs, ambos interpretados por Broadbent) e inclusive frases adquirem novos
contextos ao ser reproduzidas por interlocutores diferentes. Todavia, há bem
mais debaixo desta simplória interpretação, e a transcendentalidade do
espírito, o carma, vidas passadas e futuras rapidamente tornam-se chaves para
solucionar o intrincado roteiro – uma interpretação que aceitei de olhos
fechados nas primeiras vezes que assisti ao filme.
Assim, os personagens vividos por Tom Hanks,
por exemplo, reproduziriam a evolução de um espírito mesquinho e traiçoeiro
naquele capaz de sacrificar a sua crença em favor de uma raça chamada prescientes
(e é interessante observar que certas características egoístas mantêm-se
intactas ao longo dos séculos, como após assistir covardemente a um parente ser
morto). Não consigo mais aceitar essa interpretação, óbvia demais para mim.
Opto por outra em que a marca do cometa simboliza a perpetuação de um espírito
reencarnado em diversas faces, não sendo em vão, portanto, que aqueles que a
ostentam sejam homens cujas decisões os levaram a tornar-se heróis e até
mártires de uma causa nobre (abolição da escravatura, a derrota da
Unanimidade). Da mesma maneira, figuras como aquelas interpretadas por Hugo
Weaving e Hugh Grant permanecem estagnadas porque representam a situação ser
superada – a escravidão, a opressão de uma corporação -, não evoluindo em nada
ao longo da história.
Com uma direção de arte e figurinos
irrepreensíveis, uma ótima maquiagem – as vezes é difícil descobrir debaixo do
látex quem é quem, sobretudo Hugh Grant, embora não haja comprometimento da
expressividade dos atores -, e bons e orgânicos efeitos especiais, é a
fotografia de Frank Griebe e John Toll que mais impressiona. Eles conferem um
tom opressivo à Nova Seul enquanto abundantes sombras retratam a
homossexualidade mantida em sigilo pelo músico Robert Frobisher ou cores
dessaturadas setentistas ilustram com perfeição o tom investigativo
jornalístico. Responsáveis por cenas belíssimas, como a de louças
espatifando-se em câmera lenta, eles criam também sequências perturbadoras,
como uma cruel forma de reciclagem de cadáveres.
Enquanto isso, a montagem de Alexander Berner
é um espetáculo a parte (foi um pecado ele não ter sido indicado a prêmios).
Interconectando a narrativa em um todo coeso e fluido por meio de raccords
visuais (cavalos cavalgando transformam-se em trilhos de trens), sonoros (após
Sixsmith pedir ajuda, a ação corta para Cavendish enumerando o que precisa) ou
uma combinação dos dois (Vou guiar você aos portões do diabo, afirma Zachry,
para no instante seguinte o portão do asilo abrir-se para Cavendish), o
montador confere a uniformidade exigida pela narrativa, criando também
sequências gêmeas memoráveis, como a fuga sobre uma ponte futurista
entrecortada com uma cena passada sobre o mastro do navio (inclusive os ângulos
usados são os mesmos). Da mesma forma, a trilha sonora de Reinhold Heil, Johnny
Klimek e Tom Tykwer revisita os tons do Sexteto Cloud Atlas com ligeiras
variações para associar uma história à outra.
Derrapando só em reaproveitar Tom Hanks e os
demais em figurações que mais distraem do que acrescentam, A Viagem é uma
surpreendente obra de arte que traduz, ao menos a meu ver, com perfeição a
magia do cinema, em que todas os ofícios colaboram para criar uma história
indivisível disfarçada em diversos rostos, filosófica com a sua mensagem
esperançosa e espiritual e perpétua como poucos filmes que já vi”.
Márcio Sallem – O Estado
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